sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Rio, cidade sitiada

Voltei a morar no Rio em 2010, após uma temporada na capital paulista que durou 6 anos. Eu estava lá em 2006 quando a maior cidade do Brasil simplesmente parou, em plena segunda-feira, dia útil, por ordem do PCC. Escolas fecharam, trabalhadores voltaram pra casa (muitos a pé porque o transporte público também se recolheu diante das ameaças), e às 19h o silêncio da cidade era assustador. Naquele dia, 3 em cada 10 estudantes não foram às aulas. Por medo. E eu também tive muito medo.

Hoje, onze anos depois, na turma do meu filho mais velho que está no 8º ano de uma escola particular tradicional de Botafogo, apenas 4 de 35 alunos compareceram à aula. Isso porque o Rio amanheceu com as notícias de tiroteios intensos em diversos pontos da cidade. Na Rocinha, na Vista Chinesa, no Complexo da Maré, no Alemão, no Morro Santa Marta, nas ruas do bairro onde moro, na rua da escola onde meus filhos estudam... As notícias começam a chegar pelas redes sociais, e enquanto alguns compartilham histórias sem checar a veracidade dos relatos, outros banalizam e chamam de "histeria coletiva" desnecessária o pavor que toma conta das pessoas diante da violência que assola nossa cidade... E eu voltei a ter medo. 

A verdade é que de uns tempos pra cá ando cada dia com mais medo nessa cidade dita maravilhosa, onde a minha rotina já se alterou bastante desde 2010 quando pra cá voltei. Alguns dizem que o Rio sempre foi assim, e que agora só ficamos sabendo mais das notícias por conta das redes sociais. Está pior sim, gente, vamos encarar! Vejo acontecer ao meu redor, com amigos, conhecidos, familiares, no meu bairro, na minha rua, na rua onde trabalho, comigo. E tenho (muito) medo.

Fico observando, com olhos de quem já morou fora dessa loucura, como os moradores do Rio se acostumam com a violência. Recebi mensagens hoje que diziam coisas como "ah, tá super tranquilo, foram só alguns tirinhos de manhã, nem foi isso tudo que estão dizendo" e "vou mandar meu filho pra escola e só avisei a ele pra ficar na sala na hora do recreio. Tranquilo!".  E assim prosseguimos por aqui... indo ao Rock in Rio evitando passar pela Rocinha, indo à praia evitando aquele trecho que sempre tem arrastão (afinal, quem continua frequentando lá tá pedindo pra ser assaltado, né??), e consultando aplicativos, Twitter ou Facebook que informam onde tem tiroteio na cidade antes de sair de casa. Desculpa, mas isso não é normal, é tática de sobrevivência e tentativa de manter rotina, mas não, amigos, não é normal. 

Aos pais que não querem sucumbir e tentam levar a vida normalmente, tendo inclusive ficado chateados por considerarem que a histeria dos demais pais atrapalhou a rotina escolar de seus próprios filhos, peço sinceras desculpas, mas hoje simplesmente tive medo. E com tiroteio, perdoem-me, não vou me acostumar nunca.